quinta-feira, 23 de julho de 2009

Part-time



A minha casa. Esta casa onde habito. Onde permaneço. Para onde volto. Onde me deito. Está vivida. Desarrumada. Possuo ilhas espalhadas pela minha casa. Pequenos móveis, caixas que foram deslocadas e entre as quais me movo e contorno e rodopio e ando. Não arrumo. Não limpo. Movo-me. Adapto-me à desarrumação de minha casa. Oriento-me na confusão. Por vezes, raramente penso que poderia colocar aqueles livros na estante. Que poderia arrumar as caixas. Que poderia deslocar o cadeirão. Que poderia tornar o caótico em algo mais prático. Mas é só por vezes. Porque nada faço. Deixo-me estar. Aqui. E deitada. E lendo. E olhando no nada. Uma pilha de roupa suja a sair do saco. Duas outras de roupa lavada. Cuecas lavadas num canto. Meias já dobradas num outro. O edredon lavado e seco sobre o sofá, por dobrar. E a Verónica olha-me enquanto aqui estou sentada. A Marta está de costas para mim e quando me debruço no lavatório vejo-a a olhar-me. Existe uma caneca sobre a estante. Só a vejo quando me vou deitar e como me vou deitar não lhe mexo. Que apodreça. Que se esfume a caneca.
Digo-me. É este fim-de-semana. Mas não será. Não será neste ainda. Ou não sei. Sei que não quero arrumar. Quero destruir. Quero ser comunista. Mandar abaixo para reconstruir. Quero viver numa outra casa. Senti-la outra. Um iniciar de um ciclo. Pintar uma parede de verde. Por papel de parede no quarto. Mandar fora o roupeiro velho e que modifiquei. Atirar fora objectos. Limpar. Lixo. Lavar. Lixo. Arrumar. Lixo. Por um pano na cabeça e pintar. Encher-me de tinta. Suar. Sujar. Sujar-me. Depois um orgasmo. Deitar-me no chão do quarto e esfregar-me. Encher-me de líquidos. Meus. Ou teus. E um banho. Reparador. Olhar na casa e sorrir. Senti-la outra. Sim, uma outra. Como eu. Uma outra.
E receber o meu amante num novo quarto. Deitar-me com o meu amante numa cama diferente. Ralhar com o meu amante porque ele desarruma muito. E com o Fernando. Tentar manter a harmonia desta casa que será outra.

Vou abrir-te a porta. Está escuro nas escadas. Tens dificuldade em subir. Medo? As escadas sujas que não vês. No topo uma sanita. Uma luz no cimo.

Estou vazia. Só penso em trabalho. E nele. Parece que há notícias no mundo. Uma gripe... e umas coisas mais. O meu amante foi de férias. Fiquei sem amor. Sorrio. Pondero em recorrer a trabalhadores temporários. A um freelancer. Aceitam-se candidaturas. Sorrio. Precisa-se de homem que goste de foder. Que saiba mexer o corpo. Que encoste as mãos no meu e me faça estremecer. Que me dê prazer. Que me faça vir. Que me fure e me espete. Com força e lentamente. Que nos intervalos goste de conversar. Que ria e sorria. Que gema de prazer. Que acorde os meus vizinhos. Que me rasgue e canse. Que me faça dormir pouco. Que me esgote em mente. Que me ponha a cona dorida. Dolorida. Que me tremam as pernas no dia seguinte. Que me suje os lençóis. Que me faça o jantar. Que me deixe a loiça por lavar. Que ande nu pela casa. Que se sente no sofá a fumar. Que me toque e me beije. Que me queira bem. Que me sorria. Que goste das minhas palavras. Que me entenda. Ou não. Que me oiça e fale mais para que eu tenha de falar menos. Que me lamba. Que goste de obscenidades. De me chamar de puta. E de adorada. Que me diga o que sente enquanto fode. Um amante. Por uma temporada.

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