sábado, 4 de julho de 2009

Sinos


Edward Weston - Harald Kreutzberg

Estranho. Estranho que me sinta assim. Perante ele. Perante aquele homem que vi uma vez. Ou duas. Uma menina. 10 anos? 12 anos? E porquê? Não sei. Imagino. A testemunha dos meus gritos e da minha cara. Assustada. Aterrorizada. Em dor. Em prazer. Os pequenos filmes que chocam quem os vê.
E eu que os olho e sinto. E vejo-me sem me ver. Estou emocionalmente envolvida.
E contar é pouco. Contar... mas contar o quê? Contar movimentos e práticas? Ou contar que foi a primeira vez que eu quis algo?
Que fantasiei e fui. Fui porque existem coisas que não devem ficar na esfera da fantasia.

O comboio era lento. E eu viajava mais rápido que ele.
E o filme pixelizou-se como um filme antigo a preto e branco.
Mas eu estou lá. Naquele passado. Nas escadas, na colcha, no restaurante, no carro, na rua.
Dou-me.

E o amor. Apetece-me falar de amor. E na angústia de ter um no colo chorando com outro no sofá... chorando.
Quando forem oito horas saio.
E sim tenho de falar de ti. Esgotar-te. Escrever sobre ti. Esgotar-te.
Aguardo que te esgotes e que a minha pele saiba a morangos.
Que caia. E a memória seja trazida pelos textos.

Chamo-te cabrão, filho da puta, filho da mãe.
Olho-te e chamo-te nomes.
Como se não tivesses o direito de existir assim como és.
E agora.
E na minha vida.
E não agora.

E serei repetitiva. Até esgotar.
Até não te querer. Lá fora música. Alguém como eu toca a mesma música compulsivamente.
Não entendo. Mas já entendi. O grito de amor da música.

Camaleão. O mistério. A força. A sexualidade em ti.
No olhar e na boca.
E na palavra. A palavra.

Pergunto-me. Já me escreveram poemas. Já me dedicaram poesias. E textos.
E tu?
Tu. Sentes os meus? Sorris? Tremes? Gritas? Queres dizer-me alguma coisa?
Queres? Ou todas as cartas de amor são rídiculas...
Sim sou uma tonta. Uma tonta apaixonada.
Mas em movimento.
Sempre em movimento.
Ainda que dependente da tua respiração.
Ainda que.

1 comentário:

  1. O último e derradeiro amor e desejo é sempre o litearário. Devoramos cartas e romances de mortos para alimentar o nosso vivo desejo. A literatura tudo pode, porque se baseia no ritmado descanso da pena. Ultrapassa a nossa frágil mortalidade, sendo a sério tambem pode ser a brincar. Convoca todas as faces do desejo, superando o nosso corpo e fantasmas. Todos os homens e mulheres têm o mesmo rosto, ainda que na paradoxal singularidade do mesmo, resida a tensão da literatura na aproximação ao indizível

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