quarta-feira, 1 de julho de 2009

Panorâmica


Sandy Skoglund - Babies at paradise pond

Tinha uma janela na minha frente.
Sentada via uma rua, uma rua larga com carros e pessoas passando. Esquerda. Direita. Direita. Esquerda.
Tive vontade ir para a janela. De me encostar ao vidro. De me deixar ficar ali até à transpiração do vidro. Mas o meu corpo não obedeceu. Mantive-me sentada. Ali, observando a janela. O livro na mão. Um dedo na página adiada. Na página em que ela lhe dizia que tanto lhe fazia. Que fosse como ele quisesse. Mas eu sentia falta de paixão nas suas palavras. Uma cedência racional. E quis que ela em oposição lhe dissesse o mesmo que lhe disse. Mas com paixão, com tremor na voz, com secura no peito. Ele dormia ao que parece com a cabeça entre as pernas dela. Ela dava-se assim no sono.


Uma clínica com nome daquele que um dia me disse que eu tinha de deixar a tristeza. Como se esta fosse um vício. Larga os cigarros. Larga a tristeza.
Tomografia axial.
Seios perionasais.
Tibio-tarsica.
Crânio e perfil.


Sim. Sou eu. Sou a que chamam. A que morde. E se vomita quando olha neles.

Sai. A pé. sempre a pé. Estou capaz de andar para todo o sempre. Sempre a pé.
Tens de ir ao Campo Pequeno. Vou a pé. Tens de ir a Alfragide. Vou a pé. Tens de ir ao Porto. Vou a pé.
Sempre a pé. Sempre em frente. Um. Dois. Três. Passo. Passos.


Em frente. Em frente. Rápido. Corre. Não, não corro, mas ando rápido. Atravesso. Desvio-me.
Eu que não tenho pressa. Eu que não estou atrasada. Não estou atrasada. Estou afogueada. Desnorteada.


Desce. E agora sobe. E procuro um sinal vermelho onde parar. Porque só aí se pode pode parar. Um descanso.

Mulheres bonitas.
Rabos recheados de promessas.
Homens inquisidores.


Falo alto. Falo sozinha. Ninguém ouve.
Na Politécnica fumo um cigarro. Pauso.
Esvaio-me.

No quiosque elas frescas de vestido branco.

Traz-me um lençol para que me deite.
Aqui.

Sem comentários:

Enviar um comentário