sábado, 22 de agosto de 2009

Ping Ping


Hiroshi Watanabe, Saori Suga - Matsuo Kabuki

Acerquei-me de ti. Rápido. Rápido como tudo em mim. Rápido. Assim. Quando olhaste, eu estava colada aos teus braços. Quando me procuraste, tiveste de baixar os olhos. Quando me ouviste a voz, eu tinha a minha mão no teu cabelo. Rápido. Rápido. A luz.

Eu dançava. Na música. Dançava. Abri a porta para que entrasse. Agarrei na minha mãe e disse-lhe que o meu amor por ela era de morte. Que morreria por ela. Agarrei-a e dançámos juntas. Disse-lhe que poderia ser lésbica. Por ela. Que me espelhava lésbica. Assim lésbica. Que ficavamos bem assim juntas. Dançando. Com os olhos das minhas irmãs em nós. Invejando. As nossas ancas. O nosso abraço. O teu cheiro. O cheiro a mãe. A perfume de velha. A roupa de Senhora. De Senhora de óculos e corpo mirrado. A Senhora de Infante Santo. Cheiro. Dançamos. Dançamos. Eu e a minha mãe. Eu. Ela.

O buraco comedor de homens à porta de minha casa fechou. Fecharam-no. Os homens de calças de ganga e coletes reflectores da câmara fecharam-no. As pás nas mãos calosas enluvadas encheram-no de terra suja de fezes de pombo. Depois um homem ajoelhou-se e mostrando o rego do cu calcetou o espaço outrora salivoso. O meu buraco. O nosso buraco. Que faremos agora? Que faremos? Agora todos vão subir as escadas. Agora os degraus parecerão palácio. Que faremos? E os vestidos ainda não me servem. Nem os sapatos. Desvio-os? Para Alfama. Ponho música mexicana e canto à varanda. Acendo a lanterna e aponto-a aos olhos. Pode ser que se assustem. Pode ser.

Eu entro. Entro e sempre duas mulheres aos beijos. Sempre. Diferentes. Mas sempre duas. Encostadas ao lavatório. Esfregando-se contra o lavatório. A música da noite provoca acções. E uma delas molhou-se numa mesa de vidro. Uma mesa no centro da pista. Com um homem de botas altas a despejar-lhe garrafas de vodka nas mamas. Eu saio. E na porta do lado é que eu entrava. Nessa é que eu me espelhava. E ainda que diga isto ao som de cumbias lerei ao som da música que ouvia quando te conheci. Porque tenho de me ler. Sempre. Antes. Sentir-me. Verificar se me sinto. Um bisonte. A pesar-me nas costas. A esfregar-se e eu a querer que escorregue.

Eu tinha uma cama de ferro. Guardava as pastilhas para o dia seguinte colando-as às grades da cama. Algumas colavam-se e não as conseguia tirar. Nem arrancando a tinta branca esmalte. Nem mordendo. Nada. Não mascava pastilha no dia seguinte. A geração dos números de circo para poder comer uma pastilha. E hoje tudo me é rápido. Encho a boca. E não tenho cama de ferro. Não guardo para outro dia. Carne.

Sem comentários:

Enviar um comentário