terça-feira, 10 de novembro de 2009

Vodka com sabor a baunilha


Ruela - Anarchic Freak Show

 
Vês aí esses caderninhos? De letras miudinhas... Tão miudinhas que não consegues ler. Vês? Eu leio. Eu consigo. Por vezes. Por vezes consigo ler. Consigo lembrar-me de como era. Eu. E o mundo. O meu. Porque falamos sempre do nosso. Esta noite sonhei que morria. Que me baixava para tirar cogumelos do congelador e o wok me caía na cabeça, matando-me. Morte absurda a minha.


Dias. Noites. Dias. Noites. E mandas-me dançar? Mas eu quero é chorar. Chorar estes dias e estas noites.

Cogumelos. Seitan. Cebolas das pequeninas que têm um nome que não lembro. Pimenta. Alho. Alho francês. Rebentos de soja. Couves de bruxelas. Verde. Quero verde. E champanhe que me deram para me embebedar sozinha. É triste beber sozinha. Não? Sim, talvez não. Desde que tenhamos copos lavados. Não te rias. Eu falo de coisas sérias. Por vezes torna-se difícil ter copos lavados. Ainda que eu tenha muitos copos. Raramente parto um. Eu parto pouca loiça. Sabes? Sabes. Eu sei que sabes.

Sim, é verdade, ando cansada. Cansada de pessoas. E radicalismos. Todos tem opinião formada sobre tudo. Todos. Andam todos tão bem mal informados. Tão bem partidários. E apegados a causas que os fazem clicar num botão dizendo "Eu apoio". Que apoio! Eu apoio aqui sentado de barriga sobre os joelhos. Eu sou contra a morte dos animais, dos bichos, das mulheres, dos idosos, das criancinhas, dos besouros, das carochas, dos pénis com um só testículo. Vamos todos ver verde. Verde! Gritam! E agora vamos todos ver vermelho! Vermelho! Gritam! E nunca puseram os olhos no amarelo...

Dá-me um cigarro.

Eu não sou diferente. Apenas me deito e sonho em ser. Ou estar. Ou morrer.

Tenho os pés gelados.


A minha mão de unhas arranjadas e cigarro entre os dedos aqui pousada excita-me. A minha mão é bela. Neste momento. Só por este momento. Consegues sentir a beleza desta pausa? Que nada tem a ver comigo. Tem somente a ver com aquela mão, aquela mão pousada com um cigarro entre os dedos neste teclado. Aquela mão que é minha. Mas podia ser tua. Ou dela. Sente. Por vezes a beleza atinge-me de tal forma que sinto que nada mais há a partilhar. Uma impossibilidade.

Chamaram-me de padeira de Aljubarrota. Um logro. Que logro!...

Vou jantar. Vens? Tenho vinho. E um beijo de seguida.

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