sábado, 5 de setembro de 2009

cristina


Karim Ramzi

Recomecemos... parece que um gato miou aqui ao lado. E estranho é que tenho ouvido guinchos e sons de estaladas. Aqui na rua. Mas a tua voz põe-me assim. Com vontade de pele na pele. E de dedilhar nesses teus mamilos. Pode ser perigoso mas temos as máscaras de gás. Falei-te na cozinheira loira. Na do cu de preta. A porca. Porca porque se recusava a tomar banho. E no sucesso que ela tinha na rua. Todos os homens se voltavam. Para lhe olhar no cu. Nas nádegas firmes dentro das calças de ganga. Vejo-a. Cantarolando as canções da Romana. Eu? Eu lavava os frascos e guardava-os vazios. Fiz uma colecção. Estranha. Embalagens de vidro. De plástico. Sem etiquetas. De perfume. De patés. De cremes. De amaciadores. Ainda hoje me pergunto porque guardava eu tanto frasco... Como as matrículas. Essa contei ao bicho. E num outro tempo a casa-de-banho era branca imaculada. Um dia perdi-me na Buraca. No bairro clandestino de tijolos à vista. No escuro. No escuro de portadas sem portas. No entrar e sair dali. Entrámos num bar. Escuro. Tudo era escuro. Numa Jamaica perdida nos subúrbios. Nas rastas e dentes brancos. Passei a noite a dançar com um homem de calças brancas. A sentir-lhe o alto entre as pernas. Grande. Imagino que grosso. Como me esfreguei... E arfei. A cozinheira era futuro. Um branco de cabelo encrespado. De casaco branco a condizer com as calças. E camisa aberta. Lembras? Diz-me qual a diferença entre dating e hang on. Dizes? Eu gosto mais da palavra hang on. Dá a sensação de cabide. De algo pendurado. Que podemos despir. Descolar. Mandar fora. Um cabide para pendurar. Enquanto durar o dating. Nunca gostei de datas. E a mania dos homens quererem estar com data marcada. Eu que sou de apetites. Marcar o quê? Onde? Como? Hoje esqueci-me de beber água. Bebo vinho. Bebo. Bebo. Bebo todo o vinho do mundo. E não me chega. Estão a plantar mais videiras para me fazer mais vinho. Como o dinheiro que está a ser impresso. E não me chega. Vamos pensar positivo. Chega e sobra. Sobra sempre. Tira-me essa música. Quantas vezes já a ouviste? Que chata o raio da mulher. O que pensarão os vizinhos? Ui. Os vizinhos. Não quero imaginar. Vêem-me a sair para a missa todos os dias. Ouvem-me a rezar em casa. As minhas preces são sempre escutadas. Tenho dificuldade em sussurrar. Mas não grito. Acho... não me oiço. Estou compenetrada. Gostava de ter um smoking. E uma gravata. Fascinam-me vestimentas dessas. Depois penteava o cabelo com brilhantina e punha um cigarro nos lábios pintados de vermelhão. Havia de ficar bonita. A Piggy armada em Cocas. Não tens sono? Não. Que porra. Sim. Apetecia-te um corpo. A mim apetecia-me sol na venta. Ele é perigoso. Sim. Mas está longe. Desliguei. Estás contente? Há mulheres que engordam do ar que respiram. E dos bolos que comem ao lanche. Inaceitável. Vamos encher este espaço branco de letras. E depois podemos dormir. Ele disse que telefonava. Sim. Também as outras duas centenas. Ri-te. Sim. Que grande vaca tu me saíste. As vacas são porreiras. E dão leite. Desintoxica. Permite-nos continuar a acender cigarros. Um concurso para ver quem consegue fumar mais cigarros em uma hora. Ganhavas. Talvez. O Mário seria adversário. E o tipo das Finanças. Eu tenho uma imagem romântica do fumo. Passar a ferro a fumar. Deixar cair a cinza na roupa e passar o ferro por cima. Planchar. Plancha-me. Expressão deliciosa. Plancha-me contra a parede. Plancha-me à parede. Com força. Voltou a miar. Ouves? São os homens do lixo. Larga as unhas. Gostava de reler a história do macaco e da viola. Vai dormir. Vou. Vou dormir. Vens comigo? Só se me beijares. E me abraçares... Desculpa. Esqueci-me que não tens braços.

4 comentários:

  1. Os teus títulos são sempre muito desconcertantes!

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  2. Piggy armada em cocas.
    Falas de mim, e eu não fazia ideia. Planchas bem.

    Ainda não me habituei à ideia de que estas letras aqui bem escorridas conseguem ser tão absurdamente deliciosas.

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  3. Existe um filme de Cronenberg: "Crimes of the Future"; onde um personagem guarda os diversos órgãos inusitados que lhe crescem. Como se fosse o seu pequeno museu dos mistérios e das catástrofes pessoais. Filme a ver, não apenas por este pequeno detalhe de antomia patológica. Aliás devo-te a apresentação, digamos involuntária, da película. Gracias ;)

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  4. Cristina,gatos,vinho, poesia....
    Maravilha.

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